Gosto de árvores. Mais do que de jardins. Árvores, todo mundo sabe, usando eufemismos, são nossas raízes, nos dão sombra, frutas e flores e, entre tantas outras dádivas, a possibilidade de declararmos um amor recortado na casca do seu tronco.
Eu gosto delas porque são verdes. Vacilam com o vento, fracas e fortes, permanentes. Gosto porque desenham contra o céu figuras geométricas, gosto de suas cores e folhas variantes.
Na cidade de São Paulo, elas me entristecem! Muito. Elas passam por cirurgias, mas o responsável por mantê-las vivas não sabe como tratá-las quando doentes, como aliviá-las do peso de seus braços quando pendem para um só lado. São cirurgiões que não identificam quando suas pacientes estão no fim da vida, secas e velhas. Deixam-nas tombar sem respeito aos seus longos anos de silêncio generoso.
Quando jovens, o responsável por elas não lhe oferece água, alimento e proteção suficiente contra doenças transmissíveis, vitaminas para crescer e florescer em todo seu fulgor de verdes. Não deixam elas cumprirem com sua missão: nos oferecer sombra, frutos, paz. Mas, mesmo maltratadas, nossas árvores sobrevivem contra malfeitores que as querem ver aniquiladas na sua tenra juventude. Corajosas, veem gerações passar por elas, tenazmente sobreviventes dos ventos, tempestades, e da mão do Homem!
Mas não é apenas este cenário diário desta cidade tão grande, tão sem dono, que me deixa pesarosa e ressentida.
Dirijo uma pergunta aos transeuntes das calçadas: já olharam alguma vez para a raiz de uma dessas árvores? Observaram o espaço que lhes damos para sobreviverem? Caso não, olhem para baixo quando passarem por alguma!
Nós as sufocamos com um cercado de pedra, piche e cascalho, descuidados de que elas necessitam de espaço para crescer. O espaço para sua expansão é reduzido a um quadrado de um por um até a hora de sua morte. (Seria como deixar um filho bebê no antigo quadrado de madeira até a hora de se tornar adulto. Simplesmente não cabe mais, atrofia)
É doloroso observar como suas raízes – e isso é comovente –parecem nos pedir, insistir, que lembremos delas, sua existência esquecida. Suas raízes, nas mais dolorosas contorções quebram o cercado de concreto e agressivamente invadem o espaço do caminho por onde transitamos, todos os dias, ausente qualquer lembrança de que as árvores são seres vivos. Para mim, um cenário para filme de horror!
Mas por que relaciono o descamisado e o cercado do título à uma metrópole como São Paulo? É uma analogia: como a árvore, ele também está limitado ao quadrado de cimento, piche e cascalho.
O Homem, morador de rua (os números sobem exponencialmente) está “plantado” sob pontes e nas praças de nossa cidade. Não sei se inconsciente, tal qual as árvores, do mal trato que lhe impomos. Ele, como a árvore, não tem para onde se expandir, desenvolver e florescer, sua raiz aprisionada na pobreza indulgente.
Indigno-me com esta condição cerceada em seu abandono visível igual às árvores em seu quadrado um por um. A pobreza nos alerta, como a árvore, em seu cercado de cimento, piche e cascalho.
Qualquer quadrado que cerceia a liberdade e vida, mata a saúde do tronco, pernas e braços… do caule, galhos e folhas.
Gostei do aforismo/ analogia da vida das árvores nas cidades, porque é comum em todas no Brasil. Planta-se errado (sob fios de transmissão) para depois decepa-las, deixando,-triste mutilação. Parabéns!
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Obrigada Álvaro por ter lido em primeiro lugar e segundo por ter a sensibilidade de entender o que vi.
É muito bom receber retorno.Escrevemos ( os escritores) e escrevemos mas poucos são os leitores.
Uma msg como a sua só nos incentiva a continuar escrevendo. Basta um leitor para ter valido a pena!
abraço
bettina