Sofro de esgotamento crônico da paciência!
Hoje encontro-me profundamente irritada. Não é uma sensação agradável e busco desfazer-me dela. Acordei às nove horas da manhã neste estado e, agora, cinco horas da tarde, continuo igual e, proporcionalmente, ainda mais irritada.
Se nos declaramos irritados com isso ou aquilo, apresentando um fundamento plausível por nos encontrar neste estado incômodo, as pessoas entendem e relevam porque é comum a todos. Amiúde, contudo, você pode ser considerada uma reclamona ou uma eterna insatisfeita com as coisas e a vida.
Insistente, o sentimento retorna, sinalizando o fato que tanto nos irrita. Temos, a nosso favor, uma escolha: nos perguntar o porquê ou continuar brigando com o mundo ao redor.
Mas há que se envelhecer para aceitar a irritação como um estado normal ou, em outras palavras, hoje proibidas, há que se ficar velha!
No momento, sei porque acordei às nove horas irritada e continuo igual às cinco da tarde:
A irritação é a ausência de paciência. Falta-me paciência com o já visto… o já conhecido!
Sim, minha paciência vem se esgotando, lentamente, imperceptivelmente, entre a juventude e a minha velhice e chegou ao seu ápice hoje, tanto assim que tive urgência de escrever sobre o assunto.
Senão, vejamos:
Perco a paciência com temas que são de conhecimento de todos , mas nada acontece para transformá-los, aquietá-los, mitigá-los.
Perco a paciência, como moradora de São Paulo, com a destruição do meu bairro para dar lugar a espaços – antes ocupados pelo meu sapateiro, verdureiro, costureira, podólogo – de prédios com 22 a 25 andares que comportam garagens para 7 carros, isto é, apartamentos cujo custo é impronunciável.
A placa anuncia quatro quartos. Se calcularmos um carro para cada um dos três quartos, a garagem deveria abrigar três carros e, as quatro vagas restantes, digamos, seriam para os dois ocupantes do outro quarto. Portanto seriam “necessárias” apenas cinco vagas para cinco carros.
Assim sendo, o excesso de espaço para sete automóveis, parece-me uma desordem político-social em qualquer parte do mundo de hoje.
Vi e ouvi, por dois longos anos, a profundidade descomunal da cratera criada para abrigar os sete carros no subterrâneo. O canteiro de obras era um campo de guerra contra a natureza e na qual não me alistei, confesso, no sentido de pedir ao poder público que embargasse a obra, uma vez que o lençol freático foi coberto por uma laje de cimento. Para onde canalizaram a água das torrenciais chuvas de verão?
A cidade se transfigura não porque os moradores desses apartamentos – que nascem como cogumelos venenosos – podem pagar o preço pedido e comprar sete carros. Acontece que a cidade periga afundar não só por conta das chuvas, dos bueiros entupidos e desabamentos de morros, mas, é óbvio, que teremos mais pessoas desabrigadas vivendo em barracas a céu aberto.
Sim, as construtoras e os fiscais da ordem e lei, conluiados, são moralmente responsáveis por este status quo sem mais reparação.
Claro que não posso deixar a impaciência tomar conta de mim, afinal, dirão, o que são sete carros a mais? O que você tem contra garagens? Deixa estar!
Mas, e se multiplicarmos por 100 novos edifícios com garagem para sete carros de uma só família? Como fica o trânsito que já se move em fila indiana?
Então:
Por estas razões, irrito-me com as pessoas terem sete garagens para sete carros!