Entre o Uber e os aplicativos para pinçar um parceiro para a vida, encontrei poucas diferenças. Algo me diz que eles têm em comum a instantaneidade dos sentimentos.
O Uber e o Destino estão ligados, indissoluvelmente, à informática. Pega-se um táxi como pega-se um possível namorado, conforme o desejo ou a necessidade do momento.
Esta instantaneidade que encontro para meu desejo e necessidade não torna obsoleto qualquer sentimento de outrora.
Do táxi só sobrou “o Ponto”. Para chamá-lo, era necessário ter o telefone – do ponto – instalado junto a um poste. O chofer, (à época) geralmente um senhor aposentado e, portanto, confiável. Nem sempre havia taxistas no ponto, o que obrigava a esperar bastante até um deles atender ao chamado. Não lembro ter telefonado para pedir um táxi para mim. Os adultos me mandavam ligar em busca de um para eles, isso sim! É muito provável que eu tivesse vontade de chamá-lo para me levar para a escola, mas a necessidade ou a instrução pedagógica de não se acostumar a facilidades era maior: minha condução era o bonde.
Nessa mesma época, namorar e casar era parecido com a vontade de ir de táxi para a escola, acrescida de outra: os hormônios tocavam mais alto que o trim do telefone no poste.
Relembrando hábitos, costumes e valores daquela época, começo a ver mais e mais semelhanças entre o Uber e o aplicativo de encontros. Talvez isso queira dizer que nossos sentimentos em relação à necessidade (de um táxi) e o desejo (de se unir a alguém) não mudaram. Meus amigos, amigas, solteiros, viúvos ou separados, ligados nos aplicativos de encontros cegos, sempre estão de prontidão para um café no primeiro encontro como o Uber está de prontidão para o nosso chamado.
Na era do táxi do ponto também havia o encontro cego combinado entre as tias. A moça estaria etiquetada com um lenço vermelho no pescoço, ele de gravata da mesma cor. Encontros seguros. Os pais se conheciam e caso não, conheciam quem os conhecesse.
Hoje, a escolha “do amor à primeira vista” já deve ser mais difícil a começar pela identificação da pessoa. Todos usam o mesmo jeans, uns rasgados outros não. Um tênis branco ou preto. Uma corrente no pescoço ou um brinco solitário no nariz, mas acredito que estas amostras de personalidade podem levar a cometer enganos, com a já aceita neutralidade dos gêneros. Esta realidade pode conduzir a situações não traçadas a priori: a frustração do escolhido por foto – como à época de reis e rainhas- ela a espera do príncipe e ele da princesa. Há riscos em encontrar-se com os estranhos da fotografia!
Lembro-me de uma história do século passado. Os nascidos na década de 40 podem confirmar. Ela se passa durante o processo de imigração japonesa para o Brasil. Um jovem formado em engenharia no Japão, imigrou, só, para cá. Já estabelecido, quis casar-se e enviou para o pai uma carta pedindo que procurasse uma esposa sendo a única reivindicação que ela tivesse um diploma universitário. Foi difícil realizar este desejo porque na sua província não havia moça com tal título. Teve que procurar na aldeia vizinha, encontrou-a e casaram-se por procuração. Quem contou esta história foi o filho da senhora que, tirando da carteira uma foto de seus pais, (rigidamente sentados), disse que sua mãe chegou ao Brasil depois de 40 dias de travessia oceânica, desembarcou em Santos e foi levada para uma fazenda em Curitiba. No dia seguinte, o esposo pediu o seu almoço. Ela disse não saber cozinhar uma vez que a exigência era um diploma universitário. A primeira refeição por ela preparada, o marido se recusou a comer.
Provavelmente, o neto do meu amigo confundiria a história do avô com um conto da carochinha.
Penso que a geração do século passado poderia, em vez de sofrer a cada aparição de um novo hábito, perceber que nada mudou. O passado abolido, não tem mais serventia. Minha geração está pronta para um novo amor e objetivo na vida com a aprovação inconteste dos filhos e netos. Ela deve se dizer feliz, prontíssima ao poder, em segundos, obter um táxi que a levará ao encontro cego marcado pela internet.