Não há fronteiras para o conhecimento. O conhecimento corre os 100 metros e chega em primeiro lugar. Completa-se esta imagem na corrida de bastão: a cada novo conhecimento (bastão) pega-se outro e sai-se correndo até outro vir buscar o seu e sair correndo e assim por diante, mas no caso do conhecimento não há olimpíada, limites, demarcação, impedimentos, barreiras. Ao contrário da corrida de bastão, não há vencedor. Não há equipe. O conhecimento é um trabalho solitário. A corrida termina quando o conhecimento morre conosco.
Ouvi Paul Auster contar sobre sua vida e porque escreve. Americano, novaiorquino da gema, contou algumas experiências com as quais compartilho – talvez porque temos em comum a mesma idade e porque busco escrever, quem sabe, um dia, tão bem como ele.
Fez bem à minha esperança o fato que um dos seus mais importante livros, “A Trilogia de Nova York” ter sido recusada por todos os editores nova-iorquinos durante 17 anos e apenas tornou-se mundialmente conhecida quando um pequeno editor de Los Angeles, Califórnia, aceitou publicá-lo. Recebeu cem dólares por livro. Hoje é publicado em 45 idiomas.
A esta altura da conferência diz avaliar bem mal o conhecimento dos editores novaiorquinos!
Em seus escritos Paul Auster volta e meia relata as coincidências principalmente no seu “Caderno Vermelho”. Coincidências é a mesma coisa que Jung identifica como sincronicidades. Isso acontece quando um fato “bate” com outro diverso mas pode ser interpretado – com certa abstração – como igual apesar da história ser totalmente diferente no tempo e no espaço. Vai da interpretação dos acontecimentos para quem acredita em coincidências como ele e… eu.
Por exemplo. Ao ouvir sobre porque Paul Auster escreve, pude compreender, em algumas passagens da sua entrevista, uma série de coincidências que “batiam” com algumas da minhas experiências, ou melhor, com a interpretação destas coincidências que, reveladoras emocionalmente, foram adquiridas com histórias que não podiam ser mais diversas no curso do acontecimento.
Em outras palavras, ele observa e escreve sobre os imprevistos na vida porque “imprevistos e interrupções são parte da realidade na vida das pessoas”
A diferença é que ele descreve a vida como ela é, lindamente, o conceito acima atravessado pelo sentimento das rupturas. Nos seus escritos mesmo se inventados as coincidências entre dois momentos podem acontecer na vida real.
Outro ponto, mas este não é uma coincidência minha com Paul Auster. Ele acorda às 6horas da manhã, faz seu próprio chá (nos EUA não há serviço) e começa a escrever. Para comer um sanduiche feito por ele (é um costume americano não almoçar arroz, feijão como nós brasileiros) e continua escrevendo até as 5 horas da tarde, completamente exausto. Disse que às vezes passa o dia “mexendo “em uma única frase. A noite janta pouco (o que não é um hábito americano), assiste a antigos filmes na TV. É casado com uma escritora, Siri Husstvedt há 32 anos e a ama incondicionalmente. No próximo dia a mesma rotina.
Um ponto chamou minha atenção, particularmente em tempos de digitação: ele não abre mão de escrever à mão, com caneta, depois passar para a máquina de escrever Remington, velha 60 anos onde continua “mexendo no texto”; terminada esta fase, passa para a terceira que é enviar para uma pessoa digitalizar no computador.
Porque será que escolheu escrever nos três modos conhecidos até hoje desde a letra impressa de Gutemberg? Tem um iPad ao lado apenas para obter informações com mais rapidez, pois acredita que esta é a grande contribuição da tecnologia para a arte de escrever. Sobre a Internet sua opinião não chega a ser de rejeição, mas está bem consciente dos males que causa.
É um homem comum com uma profissão que considera comum com uma vida comum. Assim Paul Auster define um escritor como não sendo um artista apesar de que os sentimentos que este busca dentro de si para expressar-se são iguais ao do ator no teatro. Não precisam ter sido vivenciados. Podem ser criados, inventados. Eles emergem sem percebermos, sem sabermos onde nascem. Simplesmente são! Disse também que em cada livro há encontros com a vida do escritor, seja a passada, a presente ou mesmo a futura que ele cria para si ou para o personagem da história. Os personagens não precisam ser reais, mas podem ser autobiográficos.
Afirma que tão somente o talento não cria nada. Apenas o árduo trabalho de escrever – ainda que seja uma única frase todos os dias da semana, do mês, do ano – é necessário para alguém se tornar um escritor.
Estes foram os principais bastões que recebi de Paul Auster nesta “corrida” do conhecimento!