Quando jovens, acreditamos ter o direito de brigar por conceitos sem a vivência experimental. Só aprenderemos mais tarde que a teoria nem sempre é aplicável à realidade. Pensávamos que ser livre era poder fazer o que o corpo desejasse, além de receber as chaves de casa e guiar automóvel em qualquer direção. Estes caminhos, muitas vezes, não nos ensinaram nada que servisse para o trabalho e a carreira que escolhemos sem conhecer. Sucederam-se escolhas como a família, sendo esta uma liberdade assumida, mas não concebida.
Para não ter que enfrentar a complexidade da vida, por achar injusto ter que viver o que não se deseja, nos enclausuramos na torre de marfim. Perda de destino, aumento de necessidades, carência afetiva, amadurecimento a fórceps iniciam a corrosão de um sentimento aprisionante, nos encontramos acorrentados à vida, convictos de que a liberdade não passa de uma fantasia assim como a decantada felicidade.
Na juventude, olhávamos com certo desprezo para a realidade externa, o espírito entulhado de dúvidas, sonhando que, caso alcançássemos a liberdade, descongelaríamos e, derretidos, viveríamos num aquário translúcido cheio de luz com outros peixes, também em liberdade para nadar para qualquer direção.
Mas, infelizmente, e esta é a parte penosa, a liberdade não se encontra nas águas límpidas, na atmosfera perfeita. Ela precisa aprender a coexistir em harmonia com as águas turvas. É assim que a liberdade floresce e suas raízes adquirem tenacidade.
A coragem para sobreviver torna-se imperial na indicação do caminho para a Liberdade para Ser.
Acredito que a liberdade chega devagar, mas apenas se conseguirmos ressignificar o nosso passado. É como arar a terra para gerar uma nova semente.
Quando o passado, sem mais significado, sem mais sentido, sem mais razão de ser, quando ele se tornar pó, tenho fé de que é possível viver a Liberdade de Ser Livre!
O título deste texto não é de minha criação. É de uma palestra ministrada por Hannah Arendt por volta de 1996, mas sem identificação de local. Diz ela:
“apenas para aqueles que conhecem a liberdade em relação à necessidade podem apreciar por completo o significado de liberdade em relação ao medo, e só aqueles que estão livres de ambos – necessidade e medo – tem condições de conceber uma paixão pela liberdade (finaliza com a palavra pública que omiti aqui).
Este trecho inspirou-me a refletir sobre: “apreciar por completo o significado de liberdade em relação à necessidade e medo.”
Penso que a necessidade de ser feliz e o medo para enfrentar os percalços impostos pela vida passam pela necessidade de fazer do passado um pozinho transparente que nunca mais vai doer de tão ínfimo em importância.
Iniciada a jornada não há mais para onde fugir porque não há mais para onde retornar. Encontrado o marco zero de onde partir, sem mais o passado a atormentar, dá para começar a perceber a leve brisa, um sopro quase imperceptível do significado liberdade. Talvez esse seja o mais longo dos caminhos em nossa vida!
Por que plagiei o título da filosofa Hannah Arendt?
Convenço-me a cada dia sobre a necessidade de encontrarmos o NOSSO LUGAR no mundo. Este LUGAR, um ponto e nada mais, se reduz a nós mesmos. Imagino que o astronauta quando viu a Terra e exclamou: Ela é azul! , ele sentiu neste lugar desértico, o quão minúsculos somos, um ponto e nada mais frente à imensidão do mundo. É possível que este astronauta possa ter intuído, ali, o sentido da LIBERDADE, de sentir o seu SER no Mundo.
Acredito que, se conseguirmos “captar” o sentido da LIBERDADE e o sentido do SER, teremos encontrado a pedra do anel. Talvez Deus esteja lá nos esperando!