São Paulo,
Ela não é precisamente bonita como Veneza, por exemplo, exceto em dias de chuva. Mas, para quem se locomove de táxi, na tentativa de escapar das avenidas intransitáveis, ela tem muito a oferecer ao passageiro atento.
Hoje, voltando para casa, após uma sessão torturante na busca de acalmar uma incurável artrose no joelho, não pude deixar de comparar meu esqueleto às árvores centenárias desta cidade!
Por conta do semáforo da Av. Brasil com a Rua Mena Barreto, no aguardo de abrir o sinal, vi uma árvore centenária cujo galho cresceu, a partir do seu tronco, muito bonito e forte e, diria até, teimoso na sua vontade de destacar-se do caule e seguir um caminho próprio. Instantemente, esta visão remeteu-me à dor que senti na fisioterapia e que ainda pulsava forte na minha lembrança.
Contudo, entre a árvore e a minha patela, vulgarmente conhecida como joelho, este ligado por ligamentos à minha coxa e à perna, imaginei o entroncamento, o nó do galho – desviado do tronco para uma determinada direção, o “joelho” daquela árvore!
(Apesar da poética entre a minha patela e o nó da árvore, ele não tem a função do joelho, uma vez que me permite andar – por enquanto – por este mundo transitório)
Estas árvores plantadas em uma São Paulo ainda cidadezinha, oitenta anos atrás, cresceram e seus galhos esparramavam-se em belíssimas esculturas naturais que unicamente o tempo é capaz de produzir.
No entanto, a loucura paulistana vem derrubando as minhas árvores, meu esqueleto, no afã construtivo de prédios gigantescos, marmorizados e cinzas, vidros espelhados e entradas de palácios.
Este fenômeno orientado pelo valor monetário de poucos trespassa não só a dor do meu joelho, mas do meu corpo todo.
Estas árvores sobreviveram até aqui, serenamente, ao contrário do nosso corpo estressado, por falta, cada vez maior, das árvores serradas sem piedade. Sua beleza jaz nas calçadas, como frangos mal destrinchados. Suas vidas desaparecerão por completo, como nós um dia!
Desejo que os prefeitos paulistanos sejam acometidos com artrose na sua patela. Que façam esta poética analogia com sua dor e, talvez, reconheçam que seus corpos são uma árvore com tronco, braços e… joelhos. Tristemente, porém, creio que eles continuarão construindo esqueletos de concreto para deixarem as suas gloriosas “árvores” de pé.
Mas, quem sabe, algumas das minhas árvores e seus joelhos, talvez resistam às obras dos prefeitos de São Paulo, a quem desejo, na escuridão do meu despeito, que sintam muita dor no joelho como castigo à sua inconsciência.
Pereceremos todos!