Revista Carga & Transporte, maio 1993
Transcrição
Falta de comunicação emperra a fronteira
Deficiências de comunicação na fronteira Brasil-Argentina estão emperrando o fluxo de caminhões, pois o novo sistema de comércio exterior, computadorizado, depende de telecomunicações eficientes, o que não existe na aduana de Uruguaiana.
Por Olides Canton
A falta de comunicações é o problema que mais emperra a principal fronteira do Brasil com a Argentina, em Uruguaiana/Libres. Por lá passam 80% das exportações e importações brasileiras no Mercosul. Segundo o coordenador da Comissão de Operações de Transporte Internacional da Associação Nacional de Transporte Rodoviário de Carga (NTC), Wilson Pelisaro, a deficiência nas comunicações é responsável pelo adiamento da inauguração de um novo terminal aduaneiro, prevista para janeiro e que, no novo cronograma da Receita Federal, só será entregue aos usuários em agosto. O novo terminal, o maior da América Latina segundo o chefe da Divisão Aduaneira da Receita Federal, Luís Bernardi, tem capacidade para 300 caminhões e custou ao Tesouro Nacional US$ 25 milhões.
Pelisaro afirma que a falta de comunicações adiou a inauguração, já que o sistema existente não está possibilitando a implantação definitiva dos equipamentos de telecomunicação. Bernardi, no entanto, diz que o adiamento foi provocado por razões burocráticas, frisando que o novo terminal está passando por licitação para escolha do permissionário que irá operá-lo.
O representante da Receita Federal, no entanto, concorda com as queixas de que a fronteira está emperrada a apenas 18 meses da entrada em funcionamento do Mercado Comum do Sul (Mercosul). Até o advento do Sistema Integrado do Comércio Exterior (Siscomex), em 4 de janeiro último, o tempo gasto nas operações de exportação/importação nas fronteiras brasileiras era, segundo ele, mínimo.
O Siscomex, reconhece Bernardi, retardou esse processo. Antes, a mercadoria chegava na fronteira e o despachante – ou representante legal da empresa – apresentava guia de exportação, nota fiscal e, no caso de produtos agrícolas, um certificado do Ministério de Agricultura. O processo levava apenas alguns minutos.
O Siscomex tornou a obtenção da guia de exportação – atual Registro de Exportação (RE) – mais simples e as operações cambiais também, mas a operação aduaneira ficou lenta por que o exportador precisa entrar no sistema computadorizado, o que antes não ocorria. O despacho aduaneiro hoje só tem continuidade se as informações estiverem disponíveis no sistema de computação.
E nesse ponto do processo, segundo Bernardi, a falta de comunicações emperra o andamento porque a fronteira tem um sistema muito precário de telecomunicações. A região de Uruguaiana/Libres, cujo sistema é comandado pela Embratel e Companhia Riograndense de Telecomunicações (CBT), tem cortes seguidos de comunicação. “Às vezes, o exportador leva horas para ter acesso à rede de computação”, afirma Bernardi. A probabilidade de ser completada uma ligação com o Siscomex naquela região é de apenas 40%, o que quer dizer que em dez tentativas somente quatro têm êxito. Outro problema é a queda constante do sistema. “O operador está concluindo uma operação e o sistema sai do ar, voltando daí a 10 minutos, meia hora, uma hora”, acrescenta Bernardi.
Os usuários daquela aduana confirmam o problema. A Tramontina, um dos maiores exportadores para o mercado argentino de talheres, baixelas, tesouras e máquinas agrícolas, segundo Jorge Luiz Zancanaro, chefe do Departamento de Exportação, está sofrendo com esse problema. “No
horário do pico a linha cai muito”, diz ele, frisando que o processo é muito lento.
O Siscomex foi implantado em janeiro e, embora a Receita Federal tenha treinado os técnicos que iriam utilizá-lo, por falta de habilidade dos
operadores e usuários houve grandes transtornos na fronteira. Pelisaro diz que um dos principais problemas é o reduzido número de despachantes credenciados para o sistema.
O Siscomex integra as atividades de registro, acompanhamento e controle das operações de comércio exterior mediante o fluxo computadorizado de informações. Dados da NTC dão conta de que, apesar das deficiências, nos últimos quatro anos cresceu em 900% o número de veículos de transporte de carga internacional que usam o complexo Uruguaiana/Libres. Em 1989 passaram por aquela aduana 20 mil caminhões, número que cresceu para 103 mil no ano passado, estimando-se que chegue a 200 mil em 1993. A média diária é de 500 caminhões com cargas de exportação (80% para a Argentina), 200 de importação e 300 vazios. Pelisaro diz que o potencial de Uruguaiana/Libres é de dois mil veículos/dia, e afirma não entender como um caminhão pode ficar dois dias parado se a cada 24 horas tem um prejuízo de US$ 200.
Para a presidente da Associação Brasileira dos Transportadores Internacionais (ABTI), Betina Lenci, o que ocorre com o Siscomex é um período que ela chama de adequação, enfatizando que o sistema ‘‘veio para ficar’’. Ela considera essa experiência absolutamente positiva, dizendo tratar-se da solução “mais moderna, dentro do sistema de tributação, que se implantou nos últimos anos”. Lenci aposta que as deficiências são apenas momentâneas, não provocadas pelo processo em si mas pela falta de equipamentos, no caso, de telecomunicações.