Transcrição
Transportes Novos acordos internacionais
Revista Comercio Exterior – nov / dez 1986
Há duas boas novas no setor de transportes vinculados ao comércio exterior. Dois acordos firmados entre transportadoras brasileiras e portuguesas vão facilitar as operações de importação e exportação de produtos nacionais destinados à Europa. Com a redução de custos de fretes e entrega garantida da mercadoria na porta do importador, os acordos abrem caminho para introdução, no Brasil, de um sistema tradicional no mercado europeu, denominado transitário. Os acordos resultam do estreitamento das relações comerciais entre os dois países, um dos objetivos da visita do presidente José Sarney a Portugal, em maio deste ano.
Na prática, a vantagem para o exportador é que em ambos os países haverá um encarregado (o agente transitário) de todos os detalhes da operação, desde o planejamento de embalagens para os produtos até a entrega da mercadoria, utilizando os meios de transporte que se fizerem necessários. Também permite a abertura de uma “porta de acesso” à Comunidade Econômica Europeia.
A primeira associação, entre a empresa mineira H. Picchioni Comércio Exterior e a Fortumar Marítima de Portugal Navegação Comércio e Transportes, ocorreu menos de uma semana após os entendimentos do presidente Sarney com o governo português. A iniciativa seguinte caberia à Companhia Transportadora e Comercial Translor, sediada em São Paulo, juntamente com a Transnáutica Transporte e Navegação, lusitana, que planejam a criação de uma joint-venture, caso o período de estágio de cooperação seja bem-sucedido.
O acesso ao transporte internacional door-to-door (porta a porta) e a atuação como agente transitário são os aspectos mais importantes dos acordos, do ponto de vista das empresas nacionais. Da eficiência desse agenciamento depende a redução de custos da operação e a oportunidade para que os produtos brasileiros obtenham preços mais competitivos no mercado internacional.
Mais conhecido como “o arquiteto da área de transporte”, o agente transsitário se responsabiliza por várias etapas da operação, desde a escolha do melhor meio para transporte da carga – visando a economizar em fretes sem prejuízo para a pontualidade da entrega – até o despacho aduaneiro, liberação na alfândega e armazenamento.
Para a Translor – dona de um faturamento de 2,5 milhões de dólares -, o acordo representa a oportunidade de absorção da tecnologia necessária para sua atuação no setor de transportes internacionais. Apesar de fundada em 1958, há apenas cinco anos a empresa resolveu deixar de prestar serviços exclusivos à indústria automobilística para investir no setor de transporte de cargas em geral.
– Estamos acordando para a importância do transporte no comércio exterior – afirma.
Também otimista quanto à ampliação dos negócios entre Brasil e Portugal está a direção da H. Picchioni, grupo estabelecido há mais de 40 anos em Belo Horizonte e que acaba de receber c prémio Minas Exporta-1986, na categoria de pioneira no setor de exportação, concedido pela Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil (Cacex) e outros órgãos vinculados ao comercio.
Pelo acordo Picchioni-Fortumar serão oferecidos serviços integrados de agência aérea marítima. despachos aduaneiros e operações de transporte terrestre para entrega das cargas aos importadores. O resultado deverá ser um aumento de cargas a serem transportadas pelas empresas brasileiras de navegação, acredita Accacio F. Santos Júnior, diretor-superintendente da empresa mineira.
Em Portugal, a Fortumar é uma das maiores agências marítimas e de transporte cm geral. A empresa opera com frota própria e está equipada com sistema de radiofonia para comunicação com a base de operações c agilização das entregas. Seus escritórios estão localizados nos portos de Lisboa, Setúbal, Viana do Castelo e Leixões. Do lado de cá do Atlântico, a Picchioni está capacitada para o transporte de cargas de exportadores e importadores de Minas, Rio de Janeiro, Goiás, Mato Grosso, Espirito Santo c São Paulo. Já realiza operações door-to-door no eixo Brasil-Estados Unidos, na exportação de componentes da indústria automobilística nacional.
O acordo Translor Transnáutica. assinado em junho, e válido ate o final deste ano. mas. dependendo da evolução dos negócios, poderá evoluir para a criação de uma joint-venture.
— A partir daí, pretendemos nos reunir para avaliar mais detalhadamente a associação e estudar a possibilidade de criarmos uma empresa conjunta – afirma a empresária Bettina Lenci.Ela explica que a ideia da formação de uma joint-venture, com condições de administrar o transporte entre os dois países, surgiu junto com o acordo de cooperação, mas observa que essa associação de capitais estará subordinada, fundamentalmente, ao surgimento de oportunidades de negócios que comprovem a viabilidade da proposta.
Dentro da estratégia de diversificação de suas atividades e ampliação de sua frota atual de 250 caminhões, a presidente do conselho de administração da Translor ressalta que a associação com a empresa portuguesa é apenas uma série de contatos visando à formação de uma rede internacional de agentes transitários.
A Translor já representa a Welz no Brasil para a comercialização de containers especiais, destinados ao armazenamento de frutas e legumes. Esse tipo de Container possui sofisticado sistema de refrigeração, possibilitando a exportação das frutas sem qualquer perda de qualidade.
Também está sendo firmado um protocolo de intenções entre a Translor e a Somai, empresa estatal de transporte multimodal da Bulgária. Este c um dos acordos que Bettina considera fundamental para os planos da empresa, pois resultará no acesso direto da Translor ao mercado do Leste Europeu.
Mas a Translor quer ir mais longe. A união com uma companhia de transportes do Japão e outro projeto em estudo, para facilitar as exportações de produtos brasileiros ao atrativo mercado japonês e aos países do Sudeste Asiático.
– Nosso objetivo é formar uma rede de agentes transitários, capaz de operar em todo o mundo. A ideia básica é que nós seremos responsáveis pelo acompanhamento dc todo o processo de transporte c embarque de mercadorias no Brasil, enquanto as companhias associadas dão prosseguimento à operação em seus países.
Serviço semelhante já é executado pela H. Picchioni, no transporte internacional para os Estados Unidos. Sua associação com a HHP International Trade Corporation permite a execução do sistema door-to-door, já que a empresa norte-americana coordena a entrega e cuida do transporte rodo- ferroviário, partindo dos portos de Norfolk e Baltimore até a região de Detroit.
Na retaguarda brasileira, a Picchioni conta com os serviços da Sada Transportes e Armazenagem para complementar a operação, através do transporte rodoviário de containers com peças de automóveis, do trecho de Betim ao porto do Rio de Janeiro.
Mas nem tudo está pronto para que o empreendimento da Translor tenha êxito. A empresária Bettina Lenci lembra que será necessária a alteração de alguns pontos da atual legislação brasileira, a fim de que seja viabilizada a criação da figura dos agentes sanitários. Entre outros problemas. ela cita a impossibilidade de as companhias de transporte poderem pagar seus agentes no exterior, de forma oficial, já que a lei sobre remessas de divisas não o permite.
A definição de uma política nacional de transportes é outra reivindicação da presidente do conselho de administração da Translor. Ela afirma que o setor opera hoje sem a eficiência desejável, devido à concentração das operações internas através de rodovias.
O governo precisa se conscientizar da importância de se criar outros programas de escoamento – conclui a empresária, apontando a necessidade de racionalização do transporte de carga.