Fiz tudo que meu amigo me pediu antes de morrer. Joguei suas cinzas ao vento na encosta da montanha mais alta que já havíamos escalado.
Surpreendi-me com a sensação de que, se meu amigo tivesse sido enterrado no cemitério, ainda estaria comigo. Era um amigo embaixo da terra, presente com seus ossos. A cremação, porém, deixou um buraco vazio no meu espaço cotidiano porque meu amigo desapareceu, sumiu, não existe mais nem com um nome. Não tenho mais como visitá-lo.
A cremação de um amigo deixa um vazio mais sadio, mais limpo, porém mais sozinho.
Autor: Bettina Lenci
Na juventude, tive início profissional em história da arte, fotografia e reporter. Deixei de lado essas possíveis profissões para, durante o tempo que o destino me fez ser empresária porem, sem jamais deixar de me dedicar à escrita anônima. Gosto especialmente de crônicas e de criar histórias através de contos e novelas. Ao longo do tempo, construi uma visão de mundo mais sombria em busca de personagens alinhados às virtudes, às relações afetivas, erros e acertos nas suas vidas, acompanhando seus processos de transformação. Através destes recursos e de um olhar receptivo sobre o pensamento da alma, tento transpor para o papel o Real Cotidiano de todos nós.