Amor de um Umbigo Só
Armando não conseguia dormir sozinho em um quarto desde criança. Habituara-se a dormir ao lado dos pais e irmãos, apenas separado por uma cortina de lençol.
Armando não conseguia dormir sozinho em um quarto desde criança. Habituara-se a dormir ao lado dos pais e irmãos, apenas separado por uma cortina de lençol.
O Aranha, como o chamavam na intimidade, não era um homem bom. Tecia sua rede fina e negra por sobre pessoas e fatos. Não maltratava as pessoas, ao contrário, estampava ar de compreensivo, sorria devagar mostrando dentes amarelados, assim como os dedos de nicotina e muito café.
Ela não era mais tão jovem para sentir tanta saudade dos pais, mas imaginou-os ainda vivos e se entristeceu. Por conta desta tristeza irrecuperável soube ter chegado a hora de visitá-los depois da última vez que chorou à beira dos túmulos ao enterrá-los, vinte e cinco anos atrás.
Quarta-feira de cinzas é o dia da introspecção sobre a farra solta, sem medidas para ser feliz. Mergulho na saudade do brilho, das cores e marchinhas. Lembrança da alegria e sorriso aberto sem motivo a não ser o do momento pleno e inconsequente. Quarta feira de cinzas é o dia seguinte dos acordes que ressoam…
O Cara me ama e odeia, ri da minha cara. É mentiroso, sem educação, sensibilidade zero. Usa a palavra em profusão, mas não fala; é um cartunista, um fotógrafo, piadista, escritor, músico, saudosista, técnico e muitas vezes, um boca roto. Às vezes um senhor (a) de idade, solitário. O CARA espalha-se pelo mundo, subentendo-se com…
“Damasceno, quem é esta mulher que chora”, perguntou ao ar rarefeito, D. Laura, ao lado do caixão. Ela calculou ser uma mulher miúda, passada dos sessenta anos que chorava discretamente, lencinho de renda, olhos fixos no seu marido. “Será ela a tal”?
Cortinas e colchas de quartos de hotel são os marcos que identificam a circulação de muitas pessoas pelo mesmo espaço. A sensação é a de que cada uma que ali pernoitou levou um pouco da vida delas consigo. Sem dono, mesmo no mais luxuoso hotel, as cortinas e colchas parecem sempre velhas e abandonadas. Murchas!…
Para P. Os japoneses enrolam o sushi com a mesma elegância com que arrumam um vaso de ikebana ou aparam um bonsai. Os dedos se movimentam sinuosa e rapidamente enquanto a palma úmida da mão acolhe o arroz para ser enrolado sobre o peixe. Sai um sushi por segundo, simétrico, branco e rosado. Enrolam-…
Muito recentemente aprendi a encomendar livros pela Internet. O meu grande prazer sempre foi o de ir à livraria, nem sempre para comprar algum livro. Vou porque gosto do cheiro, das fotos e desenhos nas capas, virar as páginas dos livros de fotografia e arquitetura, grandes demais para a prateleira de minha biblioteca. Colocá-los, um…
Todos os passados contem uma verdade feia. A bonita, são as lembranças. Enquanto passou anos apostando na bonita, desejando-a na perfeita verdade de seus atributos, não percebeu que a verdade única não existia. Um dia, ela bateu a porta, para sempre, disse. Do lado de cá da porta, ela deixou para trás uma verdade…