O Encantador de Serpentes
Espelho.
Vidraça.
Telhado de vidro.
Espelho de sombras alheias,
Cheias de espíritos
Mal-assombrados.
Espelho.
Vidraça.
Telhado de vidro.
Espelho de sombras alheias,
Cheias de espíritos
Mal-assombrados.
Meu avô, velho coronel, oriundo da pequena aristocracia baiana, ficava sentado em frente à uma mesa de jacarandá, à luz de uma ampla janela iluminando, por horas seguidas, um álbum de fotografias. O álbum era tão antigo quanto os 101 anos que ele viveu. Senil, folheava, página por página, voltando sempre à primeira. Ali sentado,…
A Rede foi criada para aproximar pessoas, globalizar os costumes, abolir o tempo lento, mas apoderou-se do feitiço contra o feiticeiro. Lembro quando criança de uma brincadeira conhecida como telefone sem fio. Construíamos um telefone com duas latas e um fio preso em cada ponta. Minha vizinha da janela da sua casa e eu na…
Nos almoços em casa, quando meus filhos vêm para a macarronada de domingo, sinto-me uma mãe de celofane.
Pode ser que exista: Um ponto morto que reside entre a alma e o cotidiano. É possível que exista a felicidade retida neste lugar. É possível que, neste lugar, o tempo petrifique a soma das horas e não passe. Se este espaço arejado florescer, a vida torna-se alegre, sem razão específica. Se existir, é possível…
Hoje entendi porque os votos de felicidade no dia de seu aniversário chegam acompanhados de “muita saúde”! Hoje completei 70 anos e acordei doída. Este doído do corpo foi o Tempo que pousou sobre mim ao não conseguir segurá-lo na palma da mão. A sua bruma embalou-me num sonho acordado. Não consegui evitar, mesmo doída,…
A Perda – vazio que rasteja como um animal humilhado por dentro da gente, silencioso à noite, feroz ao raiar do dia – humaniza o Homem. A gosma verde gruda nas paredes da alma e transforma-se em Dor. A grossa capa, como um tapete de trama esburacada, gruda no corpo e ilude a Solidão. A…
Os porta retratos eram lindos. Quadrados, redondos, minúsculos, em madeira, prata ou ouro entalhado ou lisos. Brilhantes ou opacos. Dispostos em cima de qualquer superfície, um estranho, ao entrar numa casa já podia, sem nunca ter estado lá, adquirir certa intimidade com os moradores ou, presenciar situações de momentos como casamentos, viagens e nascimentos. Podia…
Desde criança não gosto de acordar. Só não era um sacrifício porque, apenas amanhecia entre um cochilo e outro, punha-me a pensar sobre a vida, sempre acompanhada da preguiça sem culpa, vazia, aquela que faz a gente ficar conversando com a alma que não dorme e pergunta se ela existe.
Olhei para uma taturana gorda, longa, esverdeada, listrada de amarelo, mas ela não olhou para mim. Estava imóvel, a menos de cinco cm do meu rosto, sobre a almofada que me servia de travesseiro. Fiquei intensamente muda como uma naja a me hipnotizar. No mesmo instante lembrei que, criança, neste mesmo sítio, uma taturana, a…